No escurinho do Cine Leblon, perto do final feliz

13/02/2017

O Globo, Natália Boere, 13/fev

Quando o consultor de recursos humanos Dorival Donadão passa pelo número 391 da Avenida Ataulfo de Paiva, esquina com a Rua Carlos Gois, no Leblon, um filme vem à sua cabeça:

– Foi no Cine Leblon que vi a versão remasterizada de “E o vento levou” com a minha mulher, há 20 anos. Depois, nos hospedamos no Copacabana Palace – lembra ele, hoje com 66 anos.

Já a jornalista Constança Castello Branco, que mora no bairro desde criança, diz que costumava ir ao Cine Leblon com a mãe. Mas, sapeca, também driblava a censura para assistir, com a irmã, às produções de Elvis Presley:

– Eram filmes proibidos para menores de 14 anos. Colocávamos meia no sutiã e conseguíamos entrar – conta.

Como antecipou a coluna Gente Boa, o Cine Leblon reabre em março de 2020, após obras com projeto do arquiteto André Piva, que deve garantir ao espaço três salas de exibição e preservar o estilo art déco.

Velha porta de madeira e lobby serão preservados

O projeto é do arquiteto André Piva, que, aliás, também guarda lembranças do espaço:

– Eu sei de cor cada pedacinho desse cinema, de tanto que eu vinha. Aqui, assisti ao filme “O céu que nos protege”, do Bertolucci. Achei incrível. Tão bom e tão denso que eu vim na sessão das 14h, mas fiquei para a seguinte e assisti de novo.

Segundo Piva, um dos pedidos do grupo Severiano Ribeiro, dono do Cine Leblon, foi que a fachada, da década de 1950, fosse preservada. A obra é da construtora Mozak.

– A ideia foi deixar o cinema de rua como era. Estamos fazendo uma releitura do art déco. Os clientes vão entrar pela mesma portinha de madeira de antigamente e pelo mesmo lobby. A escadaria continua com os corrimãos dourados. Isso tudo vai voltar, e melhor. Assim como os letreiros luminosos de acrílico – diz o arquiteto.

As três salas de cinema terão “a mais moderna tecnologia existente no mundo em 2020”, segundo o grupo Severiano Ribeiro. Além do cinema e da sobreloja, com cafeteria e livraria, o terreno vai abrigar um centro empresarial de sete pavimentos, com 58 salas comerciais e três andares no subsolo (dois para estacionamento).

– A intenção é que o terceiro subsolo vire uma área de gastronomia – afirma Carolina Lindner, gerente comercial da Mozak.

Apesar de o cinema ter fechado em julho de 2014, a obra só começou em novembro de 2016. O imóvel fazia parte da Área de Proteção do Ambiente Cultural (Apac) do Leblon e era tombado pela prefeitura. O grupo Severiano Ribeiro conseguiu o destombamento em setembro de 2014.

– A motivação sempre foi preservar. Desde 1950, o Cine Leblon faz parte da história do bairro – diz Luiz Severiano Ribeiro Neto, presidente do grupo.